Relato de um brasileiro que tentou cruzar a fronteira dos EUA ilegalmente
Um sorocabano de 28 anos de idade acaba de retornar à cidade depois de permanecer três meses preso nos Estados Unidos, após uma tentativa frustrada de ingresso clandestino no país. Acompanhado de sua mãe -- ambos não querem revelar suas identidades --, eles foram um dos 1.413 brasileiros deportados em 2017. A dupla embarcou em setembro de 2017, em busca de oportunidades de trabalho para juntar dinheiro, comprar uma casa e dar melhores condições de vida à família. A tentativa de entrar nos Estados Unidos foi interrompida quando pulavam um muro que separa os dois países, na fronteira entre Tijuana, no México, e San Diego, após cinco dias na mata, sem comida. "Quando fomos pular, os guardas já estavam nos esperando", relata. De volta, depois de enfrentar dias difíceis, de pouca comida e muita discriminação na cadeia americana, ambos não querem mais saber de nenhuma aventura. "É uma coisa que nunca mais eu faço e aconselho que ninguém faça. É uma ilusão, ver pela internet é fácil. Prefiro passar um apuro aqui, mas estar perto da minha família", falou o rapaz, pai de três filhos. Segundo o sorocabano, a ideia de tentar a vida nos Estados Unidos nasceu como esperança aos dias difíceis que a família passava por aqui, tendo que pagar o aluguel e sem emprego. "A gente queria tentar melhorar." Foi quando, após pesquisas na internet, ele descobriu que a fronteira da cidade mexicana de Tijuana era a forma mais "fácil" para ingressar irregularmente em terras americanas. "Compramos a passagem parcelada, só tínhamos isso e um pouco de dinheiro para comer." Eles desembarcaram às 23h30 e andaram cerca de 10 quilômetros em busca de um lugar mais fácil de entrar. Por volta das 21h do dia seguinte resolveram atravessar. "A gente anda de dia e se esconde de noite." Foram cinco dias no mato, numa área de deserto e montanha, sem comida ou qualquer contato com ninguém. "Essa parte ninguém fala na internet. Tínhamos muita sede. Tivemos de tomar urina." Eles se guiavam, conta, unicamente pelas luzes da cidade. "Lá já nos arrependemos, mas não tinha como voltar, estávamos mais próximos da cidade." Quando conseguiram chegar ao muro e subiram, o policial já os esperava, pois já os tinha visto. "Conseguíamos chegar na cidade sem coiote e sem conhecer nada." Dias difíceis Eles se identificaram com seus passaportes e já foram encaminhados ao furgão da polícia -- cada um foi levado para um lugar. A mãe, quando interrogada, disse que queria ser deportada. Ficou 45 dias detida até ser mandada de volta. Já o filho, sem entender nada de inglês e muito pouco de espanhol, ao ser questionado se buscava asilo, disse que sim -- pensando se tratar da volta para o Brasil. A partir daí foi aberto um processo de três meses, durante o qual ele ficou preso numa cadeia comum, junto com outros imigrantes ilegais e também criminosos. "Eu não tinha nenhuma informação sobre o que estava acontecendo. Você não sai do quarto. Não sabe nem se é dia ou noite. Lá tem brasileiros há um ano e meio sem saber nada de suas famílias." Desse tempo ele nem quer lembrar: alimentação escassa, sem cobertor, sem água quente, algemado nos pulsos, cintura e pés e cada transporte, ele conta. Foi só quando a mãe voltou ao Brasil que a família soube o que havia acontecido com ambos. "Quando fui preso, pedi ajuda à imigração brasileira", conta o rapaz. Sem qualquer notícia do filho -- a família, desde o embarque, também tentava, via consulado -- a mãe foi buscar ajuda para avisar as autoridades brasileiras de que ele estava lá naquela situação. "Ninguém sabia dele." Procurou algumas pessoas, dentre elas o presidente da Câmara Municipal de Sorocaba, Rodrigo Manga. "Nunca houve um caso desses no gabinete", conta. Prestes a completar os três meses de prisão, ele recebeu a notícia, no dia 21 de dezembro, de que seria deportado no dia seguinte. "Minha vontade era rasgar o passaporte. Nem filme americano quero ver mais." Agora, ele corre atrás de um emprego. "Mas aqui em Sorocaba mesmo."
Regina Helena Santos - regina.santos@jcruzeiro.com.br
Jornal Cruzeiro do Sul - Sorocaba
Link original: http://www.jornalcruzeiro.com.br/materia/851973/sorocabano-volta-a-cidade-apos-3-meses-preso-nos-eua