Emissão de visto para brasileiro ir aos EUA dispara, fila chega a 9 meses
Ao longo dos últimos dois anos, a liberação de vistos estava restrita a casos emergenciais e se limitou a algumas unidades ou dezenas de permissões (Crédito: Agência Brasil).
Por Estadão Conteúdo, do Isto É Dinheiro - clique aqui para ver a matéria original.
A emissão de vistos americanos de negócios e turismo para brasileiros disparou e já se aproxima da média observada no período anterior à pandemia. Em dezembro de 2021, 43 mil vistos B1/B2 foram emitidos, o equivalente a 1,4 mil por dia, movimento impulsionado pela reabertura das fronteiras do país em novembro do ano passado. Ao longo dos últimos dois anos, a liberação estava restrita a casos emergenciais e se limitou a algumas unidades ou dezenas de permissões.
A corrida dos brasileiros para ir aos EUA tem feito com que o tempo de espera para uma entrevista de visto de visitante temporário no Consulado de São Paulo chegue a 294 dias corridos, mais de nove meses. No Rio, a estimativa do Departamento de Estado americano é de 183 dias; em Porto Alegre, a espera pode ser de até 227 dias, e na capital federal, 248.
A Embaixada destaca a agilidade do sistema de agendamento e diz que as indicações podem não ser precisas e atualizadas. A quantidade de emissão de vistos vinha crescendo ao longo do último trimestre do ano passado. Em outubro, o número ficou pouco acima de mil e se elevou para 24 mil em novembro com a permissão da entrada de estrangeiros.
A liberação ocorreu após uma suspensão que se prolongava desde março de 2020. Logo após o início da pandemia do novo coronavírus, a emissão de vistos começou a cair e chegou, em junho daquele ano, a somente 13. Cenário bem diferente do observado no período pré-pandemia, quando a média mensal variava de 30 mil a 50 mil. Em abril de 2018, por exemplo, chegou a ser de 57,3 mil.
Desde abril de 2021, solicitações de vistos para algumas categorias como H1-B (profissionais de áreas que requerem conhecimento especializado), H2-B (trabalhador temporário), J (intercambista) e L (transferência intracompanhia), voltadas a programas de intercambistas, voltaram a ser atendidas. Em maio, foi a vez de retomar o processamento de algumas categorias de visto de estudantes, acadêmicos, jornalistas e trabalhadores essenciais, desde que concedida uma Exceção de Interesse Nacional (NIE, na sigla em inglês).
O processo de solicitação de visto americano no geral foi retomado no dia 8 de novembro. Por causa da necessidade de cumprir protocolos de saúde e segurança, a Embaixada americana diz que o número de entrevistas ainda não pôde retornar aos patamares pré-pandêmicos. “Mas estamos fazendo tudo que está em nosso alcance para atender o maior número de solicitantes possível”, destaca, em nota.
“Estamos trabalhando diligentemente para aumentar a disponibilidade de consultas para todas as classes de vistos”, informa a missão americana no Brasil. “Desde que os serviços foram retomados, em novembro de 2021, novos horários de agendamento para entrevistas têm sido disponibilizados no sistema online, e as pessoas que já fizeram seus agendamentos podem continuar a acessar o sistema online regularmente para tentar reagendar suas entrevistas para datas mais próximas, sem nenhum tipo de cobrança extra.”
O pesquisador de direitos humanos Yuri Silva, de 26 anos, está de viagem marcada para os Estados Unidos. No dia 4 de março, ele embarca para liderar uma comitiva de brasileiros com o objetivo de intercâmbio de políticas públicas. “Nós vamos entender em Newark e em Nova York, como se dá a relação da polícia com a população negra desses territórios, com fins de comparação com o Brasil”, explica.
Os planos para viagem são antigos, datam de 2017, quando uma comitiva da Prefeitura de Newark visitou a Bahia. Com a pandemia, a viagem foi adiada algumas vezes e Silva conta ter se sentido frustrado. “Foi frustrante pois essa era uma pauta importante para o Brasil”, diz.
A emissão do visto americano foi rápida na visão dele, levou cerca de um mês – em janeiro, ele já estava com a autorização expedida. O pesquisador fez todo o processo por conta própria, seguindo orientações do site do Consulado. Ele acredita que a agilidade se deu por ter objetivo de pesquisa. “Facilitou muito o fato de eu ter apresentado cartas-convite de grandes organizações americanas. Fui convidado pela Prefeitura de Newark e por organizações da sociedade civil, como o ICJustice e o Caribbean Cultural Center African Diaspora Institute (CCDAI).”
Ansioso, agora ele cuida dos preparativos finais: compra de passagens e dólares, reserva de acomodações, roupas de frio. “Pegaremos o fim do inverno”, destaca. A comitiva fica até a segunda semana de março no país.
Quando saíram do consulado americano em São Paulo, na Rua Henri Dunant, do bairro Santo Amaro, na última quinta, 10, mesmo com os rostos cobertos pela máscara, o sorriso da médica Marina Lorenzo Costa, de 28 anos, e o da mãe dela, Graciema, eram evidentes. “É um alívio. Foi algo que ficou mal resolvido por dois anos”, explica a profissional de vendas, de 56 anos.
Os planos de visitar os Estados Unidos novamente são antigos. Elas decidiram dar início ao processo de visto em janeiro de 2020, quando o novo coronavírus já circulava pelo mundo, mas ainda parecia uma realidade distante do Brasil. A entrevista foi marcada para abril daquele mesmo ano. Em março, a pandemia se instalou e, com isso, a data mudou diversas vezes – Marina nem lembra ao certo quantas.
Para a residente em obstetrícia, as remarcações causavam estresse. “Eu faço residência, então, não tenho horário. Tinha programado para tirar o visto nas minhas férias”, fala. Como elas vivem em Curitiba, a vinda para São Paulo custa um dia inteiro exclusivo para a função. Marina conta que, quando remarcaram a entrevista para novembro de 2020, ela resolveu adiantar as passagens aéreas para a capital paulista. Porém, como não comprou bilhetes reembolsáveis, acabou perdendo o dinheiro.
Com o visto aprovado, elas se sentem mais tranquilas, no entanto, ainda vão estudar a possibilidade de viajar para Nova York. “Na época que a gente tinha marcado para tirar o visto, o dólar não estava tão caro assim”, explica a médica.
Outro fator a ser levado em conta pelas duas é a pandemia. Marina avalia que mesmo com os surtos, uma grande parcela de pacientes apresenta quadros mais controlados, mesmo assim, acha que “vai um tempinho ainda para abrir tudo”.
Assim como as curitibanas, mesmo com o visto renovado, a advogada Wendy Soliman Dias, de 39 anos, ainda não sabe quando embarca para os EUA.
Originalmente, ela tinha viagem marcada para Miami, na Flórida, em agosto de 2020. A passagem havia sido comprada ainda no ano anterior. A pandemia chegou e adiou os planos. Em novembro do mesmo ano, o visto dela e dos filhos venceu. “Desde então estamos tentando remarcar e não conseguimos”, conta.
“Eu fiquei ‘doida’. Quando abriu em novembro do ano passado, eu já comecei a caçar agendamento. Agendei pro Rio, para o dia em que abriu, quando não deu certo, nós conseguimos marcar esta data (10 de fevereiro)”, diz. Segundo ela, o atendimento na capital fluminense não aconteceu, pois oferece serviços distintos da paulista.
Como os filhos fizeram 18 anos, a renovação da autorização precisava de entrevista. “Agora, com o visto, vamos ver como vai ficar essa passagem. Porque comprada em 2019…”, diz.
A companhia aérea Latam Airlines Brasil percebeu um aumento na demanda por viagens para os destinos operados nos Estados Unidos a partir de outubro. O crescimento das buscas nas primeiras semanas, informa, chegou a ser de 300%.
Enquanto as fronteiras estavam fechadas a turistas, a companhia manteve as rotas para Miami e Nova York, saindo de Guarulhos (SP), mas com menor frequência semanal (3 voos semanais). Com a reabertura, a companhia passou a ampliar a frequência semanal de voos para os destinos e reativou a rota para Orlando em dezembro de 2021.
“A gente fechou dezembro com o fator de ocupação muito próximo de 85%, 86%. Dependendo do dia, 100%”, conta o diretor de vendas e marketing da Latam, Diogo Elias. “Em janeiro, tínhamos a mesma expectativa, inclusive com mais voos (para os EUA). Só que principalmente na segunda quinzena veio o impacto da Ômicron”, fala. O fator de ocupação, então, ficou entre 75% e 85%, com cancelamento de voos e passageiros que desmarcaram viagem.
Elias conta que o efeito da variante foi passageiro, mesmo assim, acredita que só em 2023, os níveis pré-pandemia de vendas de viagem internacional serão retomados. Isso porque, segundo ele, ainda há pressão da diversidade de regras para entrada nos países e do alto valor do dólar.
Ele destaca que a Latam ainda não retomou os voos para os Estados Unidos em outros Estados além de São Paulo. Antes, havia passageiros que embarcavam em Manaus, Salvador e Fortaleza, por exemplo. Mesmo os que saem do Aeroporto de Guarulhos representam 50% da frota anterior à crise sanitária.
A CVC Corp viu as buscas de consulta de preços e orçamentos por pacotes nos Estados Unidos, cresceram mais de 100% após o anúncio de abertura de fronteiras em novembro. A agência de viagens, porém, destaca que a retomada do turismo internacional está “mais lenta”, por causa da alta do dólar e da pandemia. Os destinos internacionais mais procurados, informa, neste momento, são Portugal, Cancun, Orlando, Chile e Buenos Aires.
Na segunda semana de dezembro, a CVC Corp informa ter havido desaceleração de vendas, sobretudo de destinos internacionais, após avanço da Ômicron. A empresa, contudo, acredita que os efeitos da variante na busca por viagens tenham sido transitórios.
Vistos de intercâmbio
Os vistos destinados a estudos, F1 e J1, passaram a crescer expressivamente ainda no primeiro semestre do ano passado com a retomada de emissão pelo serviço consular no Brasil. Com valores mensais que variam ao longo do ano, o ritmo de emissões parece retomar o que se via antes da pandemia.
Os vistos do tipo F1 são destinados a estudantes em programa de treinamento acadêmico ou de idiomas. Em geral, tem crescimento de emissões entre março e julho, quando atinge o maior pico mensal do ano. Até setembro, há ritmo de queda. As expedições sobem sutilmente até dezembro, caindo a partir do mês de janeiro.
Os vistos do tipo J1 são especificamente para intercambistas. Normalmente, tem crescimento de emissões entre abril e julho, quando atinge o maior pico do ano. Até setembro, há um ritmo de queda. As expedições sobem até novembro, caindo a partir do mês de dezembro.
O STB – Student Travel Bureau destaca que os EUA sempre foram um dos destinos mais procurados por brasileiros, por conta do “sonho americano” e da diversidade de oportunidades acadêmicas. Com o fechamento das fronteiras, as vendas estacionaram. Em abril, com a retomada de emissões, “o interesse dos brasileiros retomou com força total, colocando o destino novamente no topo do ranking dos mais populares para o intercâmbio.”
O presidente da STB, José Carlos Hauer, explica que o crescimento é grande, mas gradativo. “A gente vê um crescimento constante e espera chegar em níveis de 2018, 2019, quando as vendas estavam dando mais.” No entanto, ele acha que isso só deve ocorrer em 2023. “As pessoas estão aguardando uma segurança maior para viajar”, explica.
Diante das flexibilizações para estudantes e avanço da vacinação, a CI Intercâmbio e Viagem vendeu 30% mais pacotes para os Estados Unidos em 2021 em comparação com o ano anterior.
“Em novembro, quando ocorreu a reabertura para brasileiros com visto de turista válido e com a possibilidade de estudar por até 12 semanas com carga horária mais baixa, a procura aumentou ainda mais”, destaca, em nota.
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